Há grandes joias urbanas espalhadas pelo entorno catalão, escondidas em cantinhos, o disfarçadas de casas comuns.
Por sorte, ou por visão, na Catalunha há um bom sistema de preservação do patrimônio histórico, pelo qual se responsabilizam as próprias prefeituras depois que iniciativas privadas trazem à luz a sua importância.
A pequena cidade de Alcover, na Província de Tarragona é mais uma dessas joias.
O Museu d’Alcover foi fundado pelo nativo Andreu Barbarà Camafort em 1967 em uma antiga torre medieval do Portal de Sant Miquel. Em 1975 ele se mudou para a casa nobre Ca Batistó, um edifício histórico do século XVII, que em seu último uso particular abrigava a família Andreu que a construiu em 1682 em um prédio antigo, do qual ainda é possível ver três arcos góticos no vestíbulo.
Do período de transição do século XIX para o século XX, a casa oferece aos visitantes uma bela visão de como era a divisão da mansão burguesa, sua decoração de interiores, incluindo móveis, objetos e acessórios, conhecendo seus costumes e o ritmo da casa. vida de pessoas de um passado não muito distante.
Além da excelente preservação, o museu tenta ser o mais interativo possível, usando recursos de vídeo e telas interativas nos totens de informações disponíveis em cada ambiente.
Percebemos em Ca Batistó como a tecnologia promovida no final do século XIX transformou as casas em espaços cada vez mais confortáveis e ajudou de alguma maneira a transformar o papel das mulheres na sociedade moderna.
O Museu também abriga importantes coleções de fósseis e espaço educacional para crianças e jovens. Mas quero focar esse texto na casa, nos costumes e na vida burguesa do início do século XX na Catalunha, porque conhecemos seus donos pela casa em que habitam, não é?
O salão principal é ricamente adornado com pinturas que decoram todas as paredes. O teto tem belo trabalho em carpintaria, também pintado. As cores são variadas: detalhes em rosa, bege e verde, mas não muito saturadas, o que torna a cor mais romântica e sofisticada do que dinâmica. Também foi adicionada a cor azul escuro, que torna o ambiente um pouco mais formal e mais forte. Os desenhos das pinturas têm uma referência clássica: gregas, flores e muita simetria, mas a influência do estilo Art Déco já é percebida nos detalhes geométricos, principalmente nos cantos das pinturas e na faixa que circunda o teto. Mármore, pedra sempre nobre, cobre o chão, a lareira e alguns outros detalhes. A idéia tradicional de que todo o espaço deve ser coberto e bem acabado para representar abundância financeira, faz sentido lá.
Uma das portas dá acesso ao quarto. A alcova burguesa típica, com sua sala de estar separada de frente para a cama por uma parede fina, com um contorno em um design curvilíneo clássico. Naquela sala, encontramos objetos dos figurinos dos ex-proprietários e de outras roupas da época, e percebe-se o manequim com a roupa da mulher que começou a ser lançada no início do século XX sob os ideais do Art Déco.
Um totem com tela interativa convida você a caminhar com os dedos e os olhos pela vida cotidiana das mulheres daquela época.
Um boné típico da mulher moderna é exposto ao lado de um terno com calça e um belo vídeo simulando a antiguidade exibe na parede do quarto o ritual complicado e adiado de vestir uma dama (e pode ser visto no site do museu).
Os móveis e objetos de uso diário seguem o design da época: restos da estética Art Nouveau, ou em estilo Art Déco já incorporado que dominou o início do século. Mas na Espanha, a referência clássica ainda era muito forte na época, o que é percebido em vários móveis por seu design.
O espaço de culto sempre foi importante para as famílias católicas espanholas. Seja um oratório simples, ou uma capela inteira dedicada à Virgem e ao Menino e mais alguns santos, tendo devoção, desenvolvendo a espiritualidade era parte não apenas da confissão de fé, mas também de caráter —pois “ser cristão” já foi visto como sinal de integridade.
Os avanços da engenharia podem ser mais bem observados nas áreas de serviço e higiene: a cozinha e o banheiro.
Na cozinha, a novidade era a chamada “cozinha econômica”, que usava um sistema de canos que aquecia a água da própria cozinha e o banheiro através de caldeiras para depositar a água aquecida pelo sistema de gás, em vez de carvão , e isso significou uma grande economia de energia. Mas também havia cozinhas mistas que usavam gás e carvão.
E sobre os banheiros? O grande desafio dos países onde o inverno castiga o corpo é a hora de se banhar. A pouca água disponível no reservatório forçava a máxima economia possível de água durante o banho.
Outro aspecto muito importante foi o sistema de saneamento, que no início do século XX só existia em grandes cidades. Em Ca Bastitó, um novo sistema de descarte de evacuação foi incorporado à casa somente na década de 1960 e pode ser visto.
A decoração dos lavatórios seguiu a moda do período: a decoração com tinta esmaltada nas peças sanitárias e as paredes com revestimento cerâmico. Tudo com ar nobre e clássico.
A Ca Batistó oferece uma bela visão da vida artística e intelectual da época, quando o movimento modernista, tão importante na Catalunha, mudou muitos padrões estéticos nas artes visuais, arquitetura e literatura. Um retorno no tempo em que se começava a aprender a conviver com o novo ritmo imposto pela tecnologia, mas ainda com a calma e o prazer que aqueles tempos ainda permitiam.
Fonte de fotos e imagens:
Todas as fotos (exceto 9) – Maria Pilar Arantes, no Museu d’Alcover
Fotografia 9 – Site do museu: http://museualcover.com/vida-burgesa/una-gran-sorpresa/